terça-feira, 18 de maio de 2010

2 de setembro de 2003



Por que eu gosto de morar aqui
Roberto Duailibi


São Paulo é, em si mesma, com todos os seus defeitos, uma cidade excepcional para se viver. Não vou falar de todas as oportunidades que estão aqui, à disposição de quem tiver o talento e a gana para aproveitá-las; nem dos serviços médicos, das universidades e faculdades, dos cursos livres, das exposições, das peças de teatro e dos filmes, dos restaurantes, shoppings, academias – e até da proximidade que temos das montanhas, das praias e do mar.
Para quem tem a vocação para os relacionamentos, as amizades também encontram-se à distância de um telefonema – e as possibilidades são infinitas. Mesmo a solidão como escolha e o confortável anonimato podem ser usufruidos por quem os quiser.
E para as pessoas que moram aqui no Morumbi ou no Real Parque? Sim, nós nos habituamos a criticar a insegurança que se instalou, nos últimos tempos, em nossos bairros. Criticamos o mau estado do asfalto e das calçadas, a ausência de esgoto até hoje, e os habituais apagões de uma rêde elétrica precária, os constanes engarrafamentos das pontes.
Mas todos esses são problemas que, sabemos, a médio e longo prazo serão corrigidos, e cuja solução depende, em larga escala, de nossa própria capacidade de nos organizarmos politicamente.
Mas quais são, então, comparadas com as dos outros bairros, as vantagens de morar aqui? Sou um dos pioneiros desse bairro. Quando mudei para cá, há 36 anos, sobre a colina norte do grande vale do Pinheiros, só existiam três ou quatro casas em toda essa área. Vizinhos à casa de fazenda construída pelo Regente Feijó e sua capela, ainda em ruínas, na altura da avenida Morumbi 5500; uma esquina abaixo, a capelinha de São Sebastião, dos escravos da fazenda, na esquina das ruas General Almerio de Moura e Bandeirante Sampaio Soares, apenas minha casa e a do professor Bardi, então diretor do MASP. Não existia um só prédio no Real Park; todas as casas, modestas, eram de antigos colonos da fazenda de chá que deu origem ao nome Morumbi. Onde hoje é a praça Visconde de Cunha Bueno havia apenas o cocoruto de um morro inacessível. Uma noite, o então prefeito Olavo Setúbal veio jantar em minha casa e, apontando em direção ao morro, disse-nos, bem informado como estava, que brevemente ali estaria repleto de edifícios residenciais. Ninguém ainda poderia imaginar isso.
De lá para cá o bairro mudou muito, mas manteve muitas de suas vantagens. O ar continua um dos melhores de toda a capital. Enquanto em alguns bairros a poluição é uma presença pouco saudável, aqui ainda podemos respirar a todo pulmão. Certamente nossos bairros constituem a área mais arborizada em toda a cidade, com ruas e praças repletas de pinheiros, araucárias, cisalpinas e o nativo pau-ferro, árvore majestosa e cheia de força. O ruído urbano também ainda está longe, e as noites são silenciosas. Temos praças onde ainda podemos praticar caminhadas com segurança – pelo menos umas quatro, algumas sendo exemplos de conservação, como a Praça Poeta Drummond de Andrade, a Praça Vinicius de Moraes, a Praça preferida pelos donos de cachorro na rua Joaquim Cândido de Azevedo Marques, para a qual devemos reinvindicar o nome de dois ilustres vizinhos que já passaram para a história, o colecionador e empresário Mário Pimenta Camargo ou o excelente pintor Rebolo.
Dos andares mais altos de alguns prédios pode-se vislumbrar uma paisagem bem paulista – a cidade lá longe, com suas luzes e seus movimentos, seu nascer do sol. E o ruído dos aviões de Congonhas, que nos diz que o Brasil inteiro está despertando com São Paulo.
Perto, mas não tão perto que chegue a incomodar, temos um dos maiores estádios de esportes do país, e para quem gosta de futebol os jogos são uma excelente oportunidade de convidar seus amigos estrangeiros em visita à cidade, e principalmene para estimular em seus filhos e netos o amor aos esportes e a convivência com as brasileiríssimas torcidas. Outro bom clube, o Paineiras, encontra-se do outro lado da avenida. Ainda nas proximidades, dois bons hospitais, um deles incluindo-se entre os melhores em toda a América Latina.
Há ainda escolas excelentes, como a Quintal e a Escola Morumbi, da grande líder educacional, dona Janete, e grandes academias para quem quer manter a forma. Escolas de natação, várias.
No lado sul da ponte do Morumbi, portanto próximos e longe, alguns dos mais modernos hotéis da atualidade, com seus restaurantes, spas, massagens, saunas, salões.
Estamos a uma distância razoável também, do mesmo lado, de três excelentes shoppings, dois dos quais com bons cinemas, lojas elegantes e divertidas praças de alimentação.
Do outro lado, a praça Alfredo Volpi, ótima para se caminhar e, um pouco mais adiante, o melhor clube para quem gosta de praticar tênis e caminhada com a maior segurança, o Jockey Club, um fantástico espaço, com o maior volume de metro quadrado por frequentador. O horizonte do clube, sua planura, seu verde, os cavalos treinando ou competindo, o cheiro de fazenda, e principalmente seus restaurantes, nenhum outro bairro tem.
E, de todas as vantagens de quem mora no bairro, a presença da Fundação Maria Luísa e Oscar Americano, um dos pequenos museus mais elegantes em todo o mundo. Visitá-lo é um mergulho na História contemporânea de nosso país e a oportunidade de obter um grande conhecimento do que foi, principalmente, o Segundo Império. Só os quadros de Franz Post, de Portinari, de Di Cavalcanti, as esculturas de Bruno Giorgi e Brecheret valem várias visitas. As manhãs musicais sempre atraem grupos de amantes dos clássicos, que se deleitam também com o requintadíssimo jardim da casa, os móveis, as exposições. E, durante os dias de semana, o já famoso salão de chá da tarde.
O próprio Palácio dos Bandeirantes, aberto à visitação em muitas ocasiões, é um excelente museu, com seus quadros, suas esculturas e móveis coloniais. Um bom lugar para levar seus filhos, que podem sonhar ocupá-lo um dia...
Enfim, gosto de viver aqui. Temos excelentes vizinhos, muitos amigos, e sei que há muita solidariedade. Como em tudo, depende de como você olha a vida. Pode-se viver no melhor lugar do mundo – se você souber olhar à sua volta.

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